sexta-feira, 26 de novembro de 2010

DIREITO DE PROPRIEDADE

Celebram-se daqui a dias, 62 anos sobre a assinatura da Declaração Universal dos Direitos do Homem, magna carta que formata hoje, praticamente, todos os ordenamentos jurídicos do mundo, independentemente dos sistemas políticos que os regem.
O artº 17º da Declaração, confere o direito de propriedade, sem excepções, a todas as pessoas, singulares ou colectivas, não podendo elas, dele serem privadas arbitrariamente.
Os proprietários podem exercê-lo plenamente, colhendo os seus frutos e usufruindo destes em benefício próprio.
É um direito “erga omnes”, transmissível por morte aos herdeiros, e que só se perde por alienação, dissolução da sociedade proprietária, usucapião, evicção e expropriação.
Pode ainda ser sujeito a restrições legais para protecção de património histórico, cultural e artístico, para protecção ambiental, agrícola e urbanística, para benefício comunitário e para protecção de interesses de defesa militar do território.

Concomitantemente, é doutrina pacificamente aceite desde há séculos, que a propriedade tem uma função social e, como tal, o Estado pode estabelecer as referidas limitações ou restrições à exclusividade e plenitude desse direito, para sobreposição do interesse comum ao interesse particular.
E é à sombra destes estimáveis princípios, embora, curiosamente, não especificados na Declaração Universal, que se têm detectado os maiores abusos por parte dos Estados.
Com efeito, não são poucos os casos em que os Estados, ou empresas por ele participadas, expropriam propriedades com fundamento em alegado interesse público, dando-lhes mais tarde um destino diferente daquele com que invocaram a expropriação, sem que os proprietários expropriados, ou talvez melhor dito, esbulhados, exerçam os seus direitos a indemnização ou ao regresso à situação inicial.

Muitas vezes não o fazem, ou por ignorância, ou por conformismo ou por acharem que lutar judicialmente contra o Estado é demasiadamente dispendioso, moroso e de resultados incertos.

Certamente, acham que é como lutar contra moinhos de vento...

Rui Felício

12 comentários:

  1. Embora tendo conhecido vários casos similares, aquele de que soube há pouco foi o que me levou a escrever este texto, certamente pouco apelativo para a maioria.
    Mas é com alguma revolta que acabo de ter conhecimento de que num terreno particular expropriado pela REFER há meia dúzia de anos, por um preço irrisório, com o fundamento de alargamento de uma Estação da margem Sul do Tejo, foi agora aprovado pela Câmara Municipal, um projecto urbanistico de habitação que uma empresa subsidiária da Refer ali submeteu!

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  2. É do consenso geral, que se trata de uma luta entre David e Golias: Por vezes, pessoas ou Empresas, arrastam-se na procura de se lhes ver reconhecida justiça. Lutam contra os tais moínhos de vento. Neste manancial de golpadas recordo esta, sem referir, com o é óbvio a pessoa em causa: o senhor A, presidente de uma determinada Câmara do país, sobe da venda de um terreno de uma determinada senhora. Contactou-a e comprou-lho por um preço irrisório. Depois, bem, depois, revendeu o terreno por um preço exorbitante à Câmara onde POR ACASO, era ele o presidente. O local, é hoje o lugar de aparcamento dos autocarros e viaturas da dita Câmara.Foi comprado "desinteressadamente" com esse intuito, metendo ao bolso uma fortuna. O caso está em tribunal, logo que a ex-propritária sobe do negócio da china. Mas, diz-me quem sabe,que as possilidades de retorno do terreno, ou indeminização por se sentir enganada, são praticamente nulas ...

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  3. Rui Felício,

    Um artigo didático, dentro da linha que escolheste trilhar e nos vais habituando. Obrigado. Moinhos de vento, e de que maneira. Quanto ao que dizes da REFER, não estando aí e pelo que me apercebo, penso que falta por esses lados um trabalho sério do jornalismo de inquérito. O trabalho que fazem aqui, levaram-nos a ver o primeiro ministro desta província assentado diante um juíz hà cerca de um mês. Já vi mais dois ex-primeiros ministros Federais na mesma situaça, pelo que fizeram nos seu reinado. Por outros motivos, corrupção, nas últimas duas semanas, dois presidentes de cãmara suspenderam os seus mandatos temporáriamente, a comissão que substitui um deles também foi logo anulada pelos jornalistas, outro teve de suspender temporáriamente certas funções e um terceiro não se quer suspender, pelo momento. Também o comandante da polícia contra a colisão, se suspendeu. Uma central sindical, aproveitou para mudar as cúpulas, pois estavam quentes, práticamente em fogo. O certo é que aqui como aí, todos fazem o mesmo mas com os tais jornalistas, vão parar em tribunal. É essa impunidade que me admira aí. Sobre isto, estou a preparar um artigo no meu blogue para os próximos dias, só que não tenho conseguido acabá-lo porque têm aparecido novidades umas atrás das outras. Um abraço.

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  4. É nestas coisas que eu não entendo qual é o papel da justiça portuguesa! Será que os juizes e ministério público alinham e ajudam os vigaristas?... Não sei!!!...

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  5. Pões sempre o dedo na ferida.
    Sabes,muito melhor que eu,que é difícil o acesso de um cidadão à justiça.
    Por vezes,a propriedade da honra(talvez a mais importante) não é defendida,por falta de recursos.
    Suponho que as eleições da Ordem de Advogados dão alguma resposta.
    Um abraço.

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  6. Com Marinho Pinto como Bastonário da Ordem acredito
    que nós ganharemos uma melhor Justiça!
    A sua denuncia e a sua luta por tal penso que
    vai tendo eco...os advogados assim pensaram...
    os grandes escrotórios de advogados deverão
    estar furibundos!!!

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  7. O Rui Felício retoma um tema que "trata por tu".
    O título do texto poderia ser "Questão de Direito ou questão de Justiça?"
    Penso que já é dado adquirido, por anteriores abordagens ao tema, que não são as Leis que estão erradas, ou mal feitas, ou injustas.
    A aplicação da Lei, muitas vezes falseando o espírito da mesma, e o seu aproveitamento para interesses particulares e desonestos, essa sim é que altamente criticável.
    Porque a Lei que permite e prevê a possibilidade de expropriação é justa e necessária.
    O direito "erga omnes", que garante a transmissão de propriedade aos herdeiros, dos herdeiros, dos herdeiros, e ainda aos vindouros, é um direito perverso. A multiplicidade de herdeiros, o seu elevado número e a perda de registo sentimental para com um bem que fora dos seus longínquos antepassados, conduz à total indiferença e ao alheamento da situação.
    É aqui que a intervenção do Poder se justifica, chamando a si a responsabilidade de colocar esse bem a favor da comunidade, exercendo o direito de expropriação.
    Por exemplo, se esta Lei não existisse, o Parque Verde do Mondego, obra de que Coimbra se pode orgulhar, continuaria a ser uma miragem; a Avenida da Lousã, que pela sua simplicidade esconde a sua utilidade estruturante, ainda não existiria. Muitos outros exemplos temos aqui à mão de semear e, tudo isto, causado pela indiferença pelos interesse comunitário de alguns dos herdeiros, dos herdeiros, dos herdeiros...
    A Lei é, portanto, justa.
    A má utilização da Lei, essa, é não só injusta como criminosa.
    E, perante criminosos que até são poderosos, é difícil a defesa dos lesados.
    Falta-lhes meios, porque a justiça é cara, falta-lhes, também e sobretudo, acreditar na Justiça...

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  8. Felício,
    Aquela do "erga omnes" não foi para armatus cagalhatorum.
    Copiei do teu texto e deu-me jeito para desenvolver a ideia...
    Abraçus.

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  9. Quero dizer ao Quito que o "seu" autarca deveria ter perdido o mandato e deveria ter sido julgado por ter cometido o crime de negociar consigo próprio...
    Está previsto na Lei, mais uma vez a Lei existe mas não é cumprida.
    Não sei onde isso se passou, nem terá muito interesse, mas o que é certo é que o dito cujo desonesto autarca não devia ter opositores à sua perversa gestão camarária...

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  10. Embora julgue que o Carlos Viana a utilizou na correcta acepção, prefiro sublinhar, para desfazer eventuais dúvidas, que a expressão "erga omnes" não está associada à transmissibilidade da propriedade por efeito de herança, mas sim ao conceito genérico de oponibilidade absoluta do exercício do direito de propriedade em relação a terceiros, que a não podem questionar ou impedir esse exercício.
    Salvo as excepções e restrições legais, de que referi as mais vulgares e que resultam da característica indissociável da propriedade como tendo "de ante" uma função social que os Estados devem defender.
    O usucapião, a evicção, a alienação e, finalmente, a expropriação são as limitações legais mais conhecidas.
    Outras há, como as servidões, as hipotecas e penhoras, os direitos usufrutuários, etc.
    São excepções e limitações ao conceito de propriedade "erga omnes", como eu disse, "estimáveis" e de aplaudir, porque o bem comum deve sobrepor-se ao interesse particular.
    O problema que quis destacar em poucas linhas é, exactamente, a ineficácia da justiça, porque as leis, como bem disse o Carlos Viana, de um modo geral estão bem feitas.
    No caso subjacente ao meu texto há uma clara infracção à lei. De facto, quando é feita uma expropriação terá que ser demonstrado o interesse público prevalecente e explicitamnete indicado a finalidade que vai ser dada ao bem expropriado.
    Qualquer destino diverso implica a nulidade da expropriação. Todavia ela tem que ser invocada, isto é, não pode ser conhecida "de motu próprio" pelo Ministério Público ou pelo Tribunal.
    E é aqui que os procedimentos se complicam e se tornam morosos, caros e ineficazes, na maioria dos casos...

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    O Carlos Viana suscitou uma questão muito importante a que, embora o comentário já vá longo, não resisto a pegar pela rama.
    Trata-se da microdifusão da propriedade, em resultado de sucessivas transmissões por heranças também sucessivas.
    A Lei, neste caso, desde há muito que estabeleceu algumas regras que, embora não a resolvendo de forma definitiva, veio pelo menos tentar fazê-lo em parte.
    Com efeito, a propriedade rústica desde há muito que não pode ser subdividida abaixo de certas áreas que variam consoante as regiões do País.
    Havendo vários herdeiros, exercerão os seus direitos em compropriedade,mantendo-se, porém, a propriedade indivisa.
    Por outro lado há a Lei do Emparcelamento, sucessivamente alterada mas que mantém o objectivo inicial que é o de obrigar a que a alienação duma parcela de terreno, abaixo de determinada área, tenha que ser preferentemente adquirida por algum dos proprietários confinantes.

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    É um tema muito interessante que também tem dado origem a muitas negociats obscuras, aqui entre particulare oportunistas ou espertalhões.
    Fica para outra vez o desenvolvimento deste tema...

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  11. De alguns erros ortográficos motivados pela pressa na escrita, peço desculpa.
    Como não me parecem alterar o sentido do que foi escrito, dispenso-me de os corrigir...

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  12. Mais uma lição do Rui Felício nos seus comentários, tendo-me vindo trazer há mente assuntos e termos de que não ouvia falar à mais de vinte anos. É muito raro aparecerem pessoas a gostar de explicar sobre o que conhecem tão profundamente e de forma tão aberta. Adoro.

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